segunda-feira, 28 de março de 2011

Corrupção

STF dá sinal verde aos “fichas-suja”

Embora encontre respaldo no rechaço da população aos políticos, lei não impede corrupção e pode ser usada para criminalizar movimentos sociais

O julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a lei de iniciativa popular do “Ficha Limpa” foi um balde de água fria para aqueles que achavam possível a moralização da política. Em uma votação apertada, por 6 a 5, o STF decidiu que a lei não valeu para 2010.

A decisão vai alterar a composição do Congresso Nacional e das assembleias legislativas nos estados. Com a lei invalidada pelo tribunal, políticos condenados que concorreram nas últimas eleições e foram impedidos de assumir, devem agora tomar seus lugares no parlamento. O caso mais emblemático é o da senadora Marino Brito (PSOL), do Pará, que deve ceder seu lugar a Jader Barbalho (PMDB).

Decisão judicial

A maioria do STF concluiu que o Ficha Limpa, ao ser aprovada em 2010, não poderia influir nas eleições do mesmo ano. A decisão contraria o Supremo Tribunal Eleitoral, que validou a lei no ano passado. No mesmo ano o próprio STF começou a votar a lei, mas diante de um impasse na votação, resolveu esperar a nomeação do novo ministro que substituiria Eros Grau, que acabava de se aposentar.

E não deu outra. O ministro nomeado por Dilma, Luiz Fux, não decepcionou e, diante de uma votação empatada, bateu o martelo em favor dos políticos corruptos. Contando com Jader, três senadores barrados pela lei devem assumir. Na Câmara dos Deputados, 29 políticos aguardam decisão da Justiça.

Fux, aliás, parece ter mudado de opinião sobre a lei. A senadora do PSOL que vai deixar seu lugar para Jader Barbalho, relembrou que a posição do atual ministro era outra, quando foi sabatinado pelo Senado. Segundo ela, ele teria dito que “a Justiça não pode ficar de costas para a intencionalidade da lei”.

A verdade é que, apesar de toda a argumentação técnica e jurídica dos ministros do STF, o julgamento do STF é político. Como “argumentou” o ministro Gilmar Mendes, conhecido por proferir sentenças favoráveis ao banqueiro Daniel Dantas, “é preciso ter cuidado com esse interesse, o sentimento popular”.

Lei pode nem valer para 2012

O STF decidiu que o Ficha Limpa não poderia valer para as eleições realizadas em 2010. Subtendia-se, assim, que entraria em vigor já em 2012. Mas nem isso está garantido. Após a decisão do STF ganharam força setores que defendem a rejeição por completo da lei. Isso se daria através da contestação de ponto por ponto. Como atestou o ministro Ricardo Lewandowski, a lei do Ficha Limpa vai ser “fatiada como salame”.

Desta forma, já se contesta, por exemplo, a lei sob o aspecto da “presunção da inocência”. Mesmo que o Ficha Limpa só afete quem é condenado em segunda instância pela Justiça.

Ficha Limpa não acaba com a corrupção

A decisão de Fux mostra como o Judiciário funciona como braço jurídico de interesses de corruptos e poderosos. Não pode esconder, porém, a ineficiência do Ficha Limpa, caso fosse plenamente implementada.

O Projeto de Lei Popular 518/09 foi apresentado no Congresso com 1,9 milhão de assinaturas. Idealizada após inúmeros casos de corrupção, a lei causou certa comoção popular, amparando-se no cansaço da população após tantos escândalos protagonizados em Brasília. Nisso, até mesmo parte da esquerda chega a defender o projeto, como meio de se moralizar a política.

O problema é que o Ficha Limpa não garante o fim da corrupção. No máximo, causa alguns constrangimentos legais a um ou outro político, mas plenamente contornáveis na Justiça. Basta ver, além de Jader Barbalho que retorna ao Senado, o próprio Paulo Maluf (PP-SP), um ícone da corrupção no país. Além de ser novamente deputado, ele faz parte da comissão responsável pela Reforma Política, medida que ameaça tornar ainda mais antidemocrática a legislação eleitoral.

Além disso, o Ficha Limpa pode ser utilizado para criminalizar movimentos sociais, impedindo que ativistas injustamente condenados possam se candidatar a cargos públicos. Basta lembrar que o então relator da lei na Câmara, o deputado Índio da Costa (DEM), elencava o “crime” de “invasão de terras” entre os crimes que poderiam barrar algum candidato. Índio da Costa usou o projeto como trampolim político, tornando-se o vice de José Serra na disputa da presidência logo depois.

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